10 novembro 2006

É no Outono. E se dizemos que estamos no Outono é porque chegámos enfim a outros dias, Aqueles feitos de ar quente e cheios de sol já os deixámos, já nos esqueceram, quer dizer, voltarão apenas quando quiserem, talvez para o ano que virá a seguir a este. O tempo, esse que não sabemos quem seja mas que deixamos que nos leve onde quer, encarregou-se de tal façanha. É no Outono. A luz é outra, o sol não nos queima já a vista, e menos nos queima a pele. O cheiro que traz o Outono é outro, constatamos, é assim quando saímos à rua a primeira vez depois do Verão. É esse cheiro que trazes, e é com esta luz que te espero, Chegarás com ela, é o que te digo em tons de Outono, Espero por ti quando forem as primeiras chuvas, é o que te conto em tons de segredo, não te vás assustar, ou com a chuva ou com esta quebra de silêncio, mas ao dizermos a palavra silêncio estamos a mentir, não somos verdadeiros, se chove por aqui não pode fazer-se silêncio. E com isto mentimos outra vez, não conseguimos ser verdadeiros nesta história que contamos, pois se chove o silêncio cresce, faz-se mais alto, preenche todo o espaço que há entre os meus lábios e o teus, e quanto mais forte cai a chuva mais forte é o silêncio que fazemos, entre nós não há palavras onde não são precisas, porque agora é preciso ouvirmos a chuva. No silêncio não há perguntas absurdas que resistam, ficamos calados e ponto, final ou de admiração não importa, já o dissemos, calemo-nos os dois. É no Outono. E se aqui nos repetimos, e não vamos conseguir deixar de o fazer, é porque gostamos de aqui estar, eu e tu, esperando que a chuva torne a molhar-nos, e deixe vir o silêncio, já nada importa, falar, escrever, eu fui, eu parti e encontrei-te, o silêncio que regresse de vez e acabe com esses últimos dias que queimam a pele e os olhos, uma vez que eles nos deixaram já há semanas atrás. Dormimos, não dormimos, não queremos sair daqui, aqui ficamos, deixar este lugar de Outono não nos passa pela cabeça, que é o mesmo que dizer, não pensamos nisso, agora que te tenho de novo não quero sair, quero ficar, tu e eu.

Estes dias de que falamos tão demoradamente, estes a que chegámos, são em tudo diferentes dos outros que partiram, esses amanheciam, estes entardecem à beira de uma folha caída, entardecem a uma luz morena, de cabelos escuros e lábios finos, e não sabemos já se falamos de ti, aqui ao lado, de ombros nus, queimados ainda, ou desta luz de Outono, ou se de uma e a mesma coisa. Era aqui que eu gostava de adormecer, nestes dias de menos sol, Lembras-te, durante quatrocentos anos sonhei com manhãs no mar, com o vento salgado nos olhos. Tu sorris, tão bom ver-te sorrir de novo, tantas saudades, meu amor, tantas saudades, mas agora estás aqui, e eu vou ouvindo o trabalho do Outono, quase que consigo ouvir as folhas lá fora, o vento e a chuva, que este mês não acabe nunca para nós.

Esta luz, contamos, extingue-se num fogo lento de lenha, por isso dizemos que no Outono chega outro cheiro, e chegam outros dias, vindos de qualquer parte que não conhecemos mas que fica muito longe, e assim fica explicado o que queria e tu querias dizer mas não pudemos ou não quisemos porque fazíamos silêncio com os nossos lábios, porque ouvíamos a chuva, porque era Outono, porque tu voltaste depois de partires quando o Verão terminou… E porque outras areias chegam com as marés vivas de Outubro, com estas novas ondas de um mar puríssimo, dourado, que é o mesmo que dizer, Com este mar de Outubro.

1 comentário:

Sarita disse...

parece que por aqui também cai uma chuva... nem sempre miudinha =)
obrigada pela simpática visita.