15 novembro 2011

Vem começando a fazer muito sentido destapar-me um pouco, destapar os véus da dor, expor um braço, depois outro, a seguir uma perna, até me expor, inteiro, nu, a todos, a tudo, à noite principalmente, essa onde por agora vivo perpetuamente.

Vivo nela em parte com a mais lata aceitação da culpa, disso me penitencio, vivo na noite, nessa metáfora barata, corrente, mas útil, que é a noite; noutra parte, fui para ela empurrado por ter sido atacado pela doença mais vil e oportunista que conheço, e ainda hoje sinto os seus braços apertarem-me o pescoço como em tempos fizera, ainda que não o tenha feito longamente. Há pedras e bichos que me atingem numa lenta asfixia, há dedos compridos e frios que me não deixam respirar livremente.

Isso mesmo determina que hoje queira quebrar uma regra que defini há muito tempo e que exclui os desabafos, mas o que aqui vou escrevendo chega também a ser um desabafo, ainda que assuma outra forma.

O lugar onde estou agora não chega a ter sombras, pressupondo que para existirem é impreterível um ponto de luz, ainda que seja o mais frágil e vago, é uma rua sem sombras, um lugar que nenhuma luz tocou; convivo com o medo, um medo absoluto, paralisador, a lembrar altos e escuros penedos.

Há, porém, dias de muita luminosidade clara, de águas cristalinas, que passam a correr como essas águas de um rio, surgem muito rapidamente e é dessa forma que passam por mim, sendo da maior crueldade ter que assistir ao passar desses dias em que penso ter uma existência feliz sem poder colhê-los ao sol e sentar-me nesse pomar e por fim adormecer docemente.
Sei que esses dias existem e tenho deles, agora, apenas uma indistinta memória, fugaz, etérea. Mas sei que existem e quero muito voltar a esses dias onde domina uma sensação amena e de conforto que é pacificadora... essa paz desejo-a na vida, não a quero atingir pela morte.

3 comentários:

Anónimo disse...

Eu vejo aqui uns pontinhos de luz que me dizem que voltarás a esses dias. Não porque tenha alguma espécie de lâmpada mágica ou bola de cristal, mas porque tu mereces. Simples.

Abraço a ti e já agora ao cbs ali em baixo :)

Susana

Berto Igor disse...

Meu amigo, tuas palavras, ainda que carregadas de tristeza e melancolia, são muito bem ditas!
Espero que melhores, and "shine on your crazy diamond"! Forte abraço

Flour disse...

Que esses dias cristalinos corram depressa para os teus braços. Um abraço.